Verdade 4.0: a era da manipulação
particularidades e evoluções
Numa estrada do interior do país, isolados do mundo, sem telefone e, como calculam, desesperados com a inexistência de internet, demos por nós a cogitar sobre os tão apregoados "avanços tecnológicos", presumivelmente criados para nos servir.
E é vê-los a falhar, caro leitor!
A conversa fluiu entre os passageiros do carro que, felizmente, não era elétrico, pois pontos de carregamento nem um, nem mesmo bombas de gasolina. Valeu-nos o carro atestado. Este isolamento conduziu-nos à realidade 1.0, caraterizada por um mundo estático, onde nos limitávamos a observar o que nos rodeava, sem poder interagir, porque não havia com o quê.
Foi assim que nos sentimos, amigo leitor! Meros observadores.
Os políticos gostavam deste tempo, pois o cidadão era passivo e as suas reações, ainda que existissem, passavam despercebidas.
Fomos avançando na viagem, cada vez mais preocupados com o ponteiro do gasóleo...
Caro leitor, como disse um companheiro de viagem, "ainda bem que o carro é a gasoil, se fosse a gasolina já estávamos à boleia! Como não passa um carro por aqui, nem há telefone, estávamos tramados".
Resolvemos sair da estrada nacional, rumo a uma pequena cidade do interior. Chegados, vimo-nos no mundo 2.0. Já tinhamos rede, apesar da intermitência do sinal, e sentimo-nos parte daquela pequena comunidade. Quiseram saber quem éramos, de onde vínhamos, o que fazíamos.
Enfim, caro leitor, sentimo-nos como os utilizadores da web 2.0 que, sem darem conta, colocavam em risco os seus dados confidenciais.
Não havia multibanco, não aceitavam Visa, porque não gostavam dessas modernices, o MB Way era coisa do outro mundo... e, como só tínhamos 10€, limitámo-nos a tirar o carro da reserva... graças a Deus era a "gasoil".
Tivemos de rumar para o mundo 3.0. Um mundo mais complexo, em que nos compreendiam tão bem como as máquinas - abençoada web semântica, amigo leitor - e em que ninguém se preocupou em saber quem éramos. Aliás, o funcionário do posto de abastecimento passou o tempo a navegar no Facebook e mal nos encarou, apaixonado pelas publicidades escolhidas pelo algoritmo, à sua medida.
É a socieddade do big brother em que o poder nos vigia e sabe a cada instante o que fazemos, o que temos, onde andamos... e com quem interagimos. Tudo isto feito em nome de uma democracia plena.
Uma olhadela pelo escaparate dos jornais levou-nos a imaginar o mundo 4.0! E já que ninguém queria saber de nós - que saudades do interior de Portugal, dolente leitor - não tivemos outro remédio se não o de falar entre nós, o que acabou por se adequar na perfeição à sociedade 4.0, onde o modelo de interação, mais completo e personalizado, é como um espelho mágico que nos dá aquilo que "aparentemente precisamos".
Caro leitor, basicamente, andamos sempre a "comer" o mesmo, pois a inteligência artificial encerra-nos no nosso mundo e só nos mostra aquilo de que gostamos. Fónix! Então agora não podemos experimentar outras coisas?!
Somos apologistas da evolução e acreditamos que a inteligência artificial pode mudar e melhorar radicalmente a nossa vida, através da investigação e do desenvolvimento de novas soluções. Mas custa-nos pensar que somos dominados por conexões que as máquinas analisam à luz das vontades de alguns poderosos que assim NOS manipulam.
Esta nova era, caraterizada pela desinformação e pela manipulação das massas - o tal efeito Trump, caro leitor... já deve ter ouvido falar! - pode levar a sociedade para o abismo. Acreditamos que a educação é o antídoto para um mundo, muitas vezes, "de faz de conta", em que o conhecimento, o espírito crítico, a liberdade de pensamento e a autonomia de atuação de cada um de nós é o bem mais precioso, a preservar.
PS. Retomamos a estrada em silêncio. Estes momentos introspetivos fazem-nos mal. Um silêncio nostálgico tomou conta da viagem. Afinal, não somos mais do que passageiros em trânsito...